2020 Merece um texto longo

2020.
2020.
2020.
Que ano atípico. Janeiro começou bem, em Fevereiro fui uma semana de férias com a Lai a Portugal visitar os meus pais, porque o Natal 2019 foi pelo Algarve com a família dele. Nessa semana esteve um sol magnífico que até deu para ir até a praia brincar na areia e tomar vários cafés na esplanada. Estive com todos os amigos e também consegui cumprimentar toda a família. Pela primeira vez fui dançar com a minha irmã e chegamos a casa depois das 5. Foi muito divertido!
Depois Março chegou. Começou-se a ouvir falar de um tal de Corona que vinha de alguém que tinha comido morcegos num mercado chinês, infectados. No trabalho não nos foi permitido usar máscara ou luvas para não assustar os clientes. A 12 de Março, quinta-feira, logo após levar a Lai a escola, é-nos pedido para a ir buscar porque tem febre. Associei logo a que ela tivesse o vírus, pois os principais sintomas (em Março) eram febre e tosse. Durante 5 dias a febre esteve sempre entre os 38.5-40° com paracetamol a cada 3/4h. Ela não tinha forças, só queria estar deitada e de olhos fechados. A tosse não a deixava descansar de noite e a comida sabia-lhe mal. Felizmente ela foi sempre comendo e bebendo. Ao 3° dia ficou com uma conjuntive resultado das mãos de tosse e ranho na cara. Por esta altura, não havia qualquer teste que se pudesse fazer para confirmar se era Corona, ou como mais tarde ficou conhecido Covid-19. O NHS e a escola deram-nos bastante suporte. Ao fim de 7 dias como que por magia estava curada e de saúde recuperado. Não voltou a escola porque os entendidos ditaram que desde o momento que tem sintomas deve permanecer 15 dias em casa. Os restantes membros do agregado devem permanecer em casa 15 dias após a primeira pessoa ter sintomas.
7 dias volvidos e comecei eu a ter sintomas. Ao início era uma tosse aqui e ali, uma febre que vai e vem, nada acima dos 39. O pior foi após uns 7 dias, aliás o meu mais que tudo só reparou o quanto eu estava mal uma semana depois. Até lá fui dando escola a miúda em casa e tratando da casa. Não queria acreditar o quão mal estava e sendo que ele nem reparava imaginei que podia estar tudo na minha cabeça. Agora que olho para trás, quando eu achei que estava a morrer, não era exagero. Eu estive mesmo muito mal. Mal de não conseguir respirar, mal de não comer, mal de ter diarreia, mal de vomitar, mal de não dormir, mal de dores horríveis de cabeça, mal de dores do peito ao respirar. Não sei porque não fui ao hospital, ou melhor sei. Quando eu tive sintomas devia ser dia 19 Março, os hospitais estavam lotados de infectados, os supermercados não tinham comida, as escolas estavam fechadas e era preciso dar escola em casa, o meu mais que tudo estava obcecado com trabalho, fazer-me forte e não mostrar o quão mal estava era tudo que podia fazer para ajudar a família e o país. Estive 1 mês sem conseguir falar mais de 1 frase sem ficar exausta. Estive 2 meses sem sair do prédio. Estou ainda há vários meses com dores de cabeça quase diárias e de vez em quando se não respiro muito fundo as mais simples tarefas parecem levantar uma casa às costas. Desde Março que tenho trocas e falhas de memória nada normais para a minha idade. Também eu não fiz teste nenhum que confirme o que tive, não os havia. Mas entre tosse, febre, perda de paladar, vômitos, diarreia, dores de cabeça, falta de ar. Tive direito a tudo. É assustador estar doente tanto tempo, acordar a espera de nos sentirmos melhores e isso demora, arrasta e teima em não acontecer. Passaram-se 8 meses desde que estive doente. Não me sinto recuperada, não sei se voltarei a me sentir bem, resta fingir.
Hoje já há teste que em minutos se sabe se a pessoa está infectada. A quarentena já só é 10 dias. Este mês foi começada a administrar uma vacina, mas muitos estão contra. Inglaterra e o resto do mundo estiveram fechados semanas entre Março e Abril. O Reino Unido esteve em confinamento de Março a Junho, depois em Novembro e agora alguns sítios desde hoje, estando Londres incluído até, pelo menos, o fim do ano.
Não viajei mais desde Fevereiro, o ano passou e não fui a museus, espectáculos, concertos, festas, discotecas... Eles foram em Julho e Agosto até Portugal e felizmente tudo correu bem e ela pode estar com a família e ter um verão mais ou menos normal. 
Sai somente de Isle of Dogs onde vivo para ir trabalhar ou compras em locais nas redondezas. É difícil conseguir uma marcação online para entrega de mercearias, por isso desde o início da pandemia é mais um stress a acrescentar ao dia-a-dia. 
A nossa vida tem sido por casa, torna-se complicado explicarmos a nossa filha porque no dia de anos esteve aqui sozinha e não viu os amigos, porque todos estes meses não pode ir para casa de ninguém ou receber visitar. Porque é que a mãe se tem férias não pode ir ter com eles a Portugal (tinha 3 semanas, ao voltar ao UK seria obrigatório ficar 2 em casa de quarentena, logo podia estar 1 semana em PT), porque ao fim-de-semana não temos planos, não vamos a lado nenhum. É complicado porque estamos todos saturados de nos aturar em casa, de ver os dias de sol passar e nos fechados em casa, de haver ocasiões especiais que se celebram via Skype não muito animados. 
Eu sobrevivi, e achei que morria. Alguns, infelizmente, partiram nesta pandemia. A Sara que devia ter uns 32/33 e em Janeiro tinha finalmenge conseguido um óptimo emprego em Canary Wharf. E a Sara viveu comigo em Coimbra na faculdade uns 3 anos. E era a alegria em pessoa, com os seus pijamas muito largos a arrastar os chinelos. Tinha um sorriso maravilhoso, uma mente brilhante e não merecia morrer. A avó do meu marido também morreu, Adelaide de seu nome, como a minha filha. Com o seu cabelo branco como a neve, sempre pronta para um chocolatinho é um cálice de Porto.
E todos os demais, crianças, jovens e velhos que se viram desvanecer por uma doença que nem se sabe a origem ao certo e as consequências futuras de a ter. Um Feliz Natal na terra da magia!

2020.2020.2020.
Há boas coisas a acontecer também. 
As minhas amizades, não sendo muitas, estão mais forte e há pessoas que sinto muito a falta quando não as consigo ver. 
Tomei muitos cafés, bebi vários Aperol Spritz, dei muitos passeios a pé, encomendei muito fast food e fiz a vontade algumas vezes a Lai de lhe dar pastilha elástica! 
A grande mudança contudo revelou-se na nossa casa, decidi levar uma vida mais sustentável. Reduzir o consumo de plástico, de detergentes, de bens no geral. Desde dia 15 Agosto que não compro absolutamente nada para mim, nem roupa, nem acessórios, nem calçado. Nada! Estou a tentar durante 1 ano não comprar nada.
Desde Abril que comecei a fazer os nossos próprios detergentes. De momento compro ainda lixívia que uso 1x ao mês na banheira e sanita, líquido da louça e líquido da roupa. Mais nada. Champô, gel de banho, gel das mãos, amaciador de cabelo foram substituídos por versos em barra sem químicos. 
É um processo que leva tempo e dá algum trabalho mas é um processo não uma corrida.

Que este seja o Natal mais estranho de sempre. E que 2020 seja o ano mais improvável da história.

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